29/04/2012

ARTIGO

A ARTE É, VAMOS ANDANDO PELA RUA...

O silêncio e o vazio na relação entre arte e arquitectura, por Luisa Bebiano Correia

Na segunda metade do século XX os artistas procuram a arte fora dos moldes tradicionais e com a invasão da quarta dimensão (já prometida pelos construtivistas) tentam libertar o mundo dos museus e livrarias. Theodor Adorno defendeu, antes do movimento Fluxos e dos Happenings, a libertação do conceito de arte. Cage passou-a definitivamente para a rua, modificando a relação entre objecto e pensamento.
Foi na procura do silêncio por John Cage que o motor de arranque para a percepção do ser individual dentro de um contexto artístico se iniciou. Depois da performance 4′33″ nada se manteve igual.
No “silêncio” proposto por Cage, o público encontrou-se inesperadamente com ele próprio. Do mesmo modo, na procura do “puro nada” com a câmara anecoica, percebeu-se que entrar “dentro” do silêncio, pelo simples facto de respiramos, o silêncio era quebrado.
O silêncio não existe.

O mesmo se passa com o vazio.
Depois do vazio criado, a nossa existência faz com que ele não exista.
O sujeito desta consciência é a arte que se cria pela relação, como uma corrente eléctrica. Nós somos o objecto carregado de energia (que não se vê), o espaço é a ficha que está na parede. É no confronto com o espaço “vazio”, que nos ligamos à ficha da parede. E assim, magicamente, a arte aparece, sem ornamentos, apenas como cerne de uma consciência.

Nestes instantes, a imperceptível abertura da existência é oferecida à arte e cada um conjuga-se com os seus próprios impulsos, tornando-se peça fundamental da criação.

Na solitária (James Turrel, 1992) o som começa no nada e extingue-se no nada; Em Open Sky (James Turrel) o espaço vazio é a ausência de matéria que provoca a essência da beleza: um recorte no tecto enquadra o céu como se de um vazio infinito e inalcançável se tratasse.

É na dureza do ruído de todos os dias que percebemos que os espaços têm uma magia criativa que reside na sua imaterialidade.

A matéria é apreensível pelo corpo, pela sensação e pela emoção. Não é nada que se perpetue dentro ou como existência de uma alma. E é essa matéria apreensível, a que podemos chamar o início do estado de arte.
Assim, arquitectura é arte quando carregada de emoção. Arte é a procura da realidade sensível. A arte traduz-se  quando existe uma relação entre a energia e o fio condutor que a faz circular, transportando-a “para lá da imediatidade da sensação dos objectos externos.”(*)

"(…) Toda a esfera da realidade interior e da realidade exterior empíricas deve-se chamar, num sentido mais forte do que o reservado à arte, o mundo de mera ilusão e amarga decepção, e não o mundo da realidade. A verdadeira realidade só se encontra para lá da imediatidade da sensação e dos objectos externos." (*)
* Hegel, citado por Herbert Marcuse em A Dimensão Estética , Edições 70